Justiça condena hospital, empresa e prefeitura por desabastecimento de oxigênio na pandemia

O juiz da 2ª Vara Cível de Campo Bom, Alvaro Walmrath Bischoff, condenou a Associação Beneficente São Miguel (ABSM), a Air Liquide Brasil Ltda. e a prefeitura do município pelo desabastecimento de oxigênio no Hospital Lauro Reus durante um momento crítico da pandemia de Covid-19, em março de 2021. A falta do insumo resultou na morte de seis pacientes no dia 19 daquele mês e, nos 15 dias seguintes, outras 16 pessoas faleceram. A sentença determinou o pagamento de R$ 1 milhão por danos morais coletivos e a indenização individual dos familiares das vítimas por danos morais e materiais.
O Ministério Público (MP) entrou com ação civil pública responsabilizando os três réus pelo episódio. A ação também pediu a indisponibilidade de bens no valor de R$ 8 milhões e a indenização individual das vítimas e seus familiares. Investigações conduzidas pelo Instituto-Geral de Perícias, pela Secretaria Estadual de Saúde e por uma sindicância interna confirmaram falhas na ativação das baterias de cilindros reservas e no acionamento do sistema de backup, o que levou à interrupção total do fornecimento de oxigênio.
A Air Liquide Brasil Ltda. argumentou que o problema decorreu da gestão inadequada do estoque pelo hospital, que não teria seguido protocolos adequados de monitoramento. A empresa também afirmou que não tinha obrigação contratual de monitoramento remoto via telemetria.
A ABSM negou que os pacientes tenham ficado sem oxigênio, alegando que foram ventilados manualmente pelos profissionais de saúde. A entidade também sustentou que não havia relação direta entre o desabastecimento e os óbitos registrados.
Por sua vez, a prefeitura de Campo Bom afirmou que não poderia ser responsabilizada, uma vez que a gestão do hospital era exclusiva da ABSM, conforme contrato vigente. No entanto, o juiz inverteu o ônus da prova e incluiu o município no processo.
A Justiça reconheceu a responsabilidade solidária da ABSM e da Air Liquide Brasil Ltda., além da responsabilidade subsidiária da prefeitura. O juiz considerou que a Air Liquide foi acionada no dia anterior ao desabastecimento e não atendeu ao chamado a tempo, mesmo ciente dos níveis críticos de oxigênio e do aumento do consumo nas semanas anteriores.
A sentença destacou o depoimento de um médico intensivista com mais de 30 anos de experiência, que classificou o episódio como um dos momentos mais caóticos de sua carreira. O magistrado também ressaltou a repercussão nacional e internacional do caso. “A ampla repercussão nacional e internacional do episódio denota violação dos valores da coletividade de Campo Bom em relação aos eventos danosos”, afirmou Bischoff. Com a decisão, os réus deverão pagar a indenização coletiva e individualmente reparar os danos causados às famílias das vítimas.
TEXTO – José Raimundo Tramontini
FOTO – Divulgação/Ministério da Saúde